quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Ensino de língua estrangeira e socialização do saber: abrindo caminhos para a cidadania

Cristiana Tramonte 

(professora no Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Catarina- Brasil)

A questão da democratização do conhecimento tem feito parte dos debates sobre os rumos da Educação Brasileira no desafiador contexto do século XXI,  que exige redefinições de valores e comportamentos. A chamada Era da Informação delineia um quadro ao mesmo tempo promissor e sombrio, cuja preponderância de uma ou outra perspectiva dependerá de inúmeros fatores, mas certamente, é fundamental o papel do professor e da educação em geral neste contexto. O acesso ao conhecimento torna-se, crescentemente, uma das maiores exigências no campo da cidadania. No Brasil, esta necessidade se acirra, devido aos longos períodos de elitização educacional, exclusão e desigualdade social. 
O acesso às línguas estrangeiras tem um importante papel neste processo. Se levarmos em conta a extensão continental do país, e sua “solidão linguística”  na América Latina, veremos que o desafio de acessar a outras línguas estrangeiras, extrapola o âmbito da diversificação de instrumentos de comunicação, e diz respeito a uma possibilidade de uma perspectiva intercultural em seu sentido mais amplo. Ou seja, no monolingue contexto brasileiro, cujos fossos culturais são profundos, ter acesso a uma língua estrangeira consolidou-se historicamente como um privilégio de poucos. Trata-se de reverter esta tendência, com iniciativas que visem a extensão do acesso de outras parcelas da população ao conhecimento de uma língua estrangeira, como uma estratégia de democratização do saber.

A superação das desigualdades: algumas perspectivas

 A superação da desigualdade de oportunidades de acesso ao conhecimento é um aspecto relevante quando falamos de uma realidade tão excludente quanto a brasileira. O alargamento do universo cultural é um direito de cidadania e  pode ser a justificativa por excelência da importância do ensino de línguas estrangeiras nas escolas públicas, composta em sua maior parte por indivíduos oriundos das classes populares, excluídos do acesso às riquezas produzidas pela sociedade e marginalizados em termos culturais.
O domínio de língua estrangeira auxilia o educando  em seu processo de auto-afirmação, recuperação ou afirmação da auto-estima, à superação do sentimento de impotência que tão freqüentemente acomete os indivíduos das classes populares nos processos educativos na realidade brasileira. Daí a importância de iniciativas que contemplem, entre seus objetivos, o alargamento deste campo de conhecimento a uma parcela maior da população. Os estágios de Prática de Ensino de Língua e Cultura Italianas mencionados privilegiam esta perspectiva.      
Entretanto, não é somente o universo populacional que deve ser alargado, mas também o campo das ofertas em língua estrangeira, garantindo inclusão da diversidade cultural. Trauer (1991) destaca que "um diálogo entre culturas, seus estereótipos, semelhanças e diferenças tem sido o preâmbulo para oportunizar o diálogo em situação comunicativa, motivando o aluno a expressar seu ponto de vista e aprender de forma ativa a língua" (p.25). Entretanto, torna-se negativa quando existe uma relação política, econômica e cultural com o país de origem da língua, que pressupõe uma relação de superioridade e uma conseqüente geração de complexo de inferioridade. O ensino da língua estrangeira com uma perspectiva democratizante deve contribuir para superar esta relação, construindo uma visão intercultural que horizontalize a valoração das mais diversas contribuições culturais mas negando a hierarquia entre as mesmas. 
Soares (1988) tratou das questões vinculadas à relação entre linguagem/ cultura/ ideologia e relações de poder vinculadas ao aspecto cultural. A superação do sentimento de inferioridade cultural ocorrerá exatamente por um trabalho de desmistificação junto ao educando, no sentido de esclarecer serem os fatores de ordem sócio-economica - e não cultural ou lingüístico - os que classificam as classes populares como cultural e linguisticamente inferiores, dando margem aos preconceitos de diversos tipos. Este sentimento de inferioridade é um dos obstáculos afetivos ao aprendizado da língua estrangeira. “A falácia da privação lingüística e cultural deve ser explicada...isso evitará, por um lado, interferências na identidade cultural do aluno e, por outro, coibirá uma visão colonialista...do Brasil.” (p.36).

Fonte: http://www.naya.org.ar/congreso2002/ponencias/cristiana_tramonte2.htm


 

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