quinta-feira, 24 de maio de 2012


segunda-feira, 26 de março de 2012

A arte de traduzir poesia

O escritor e professor Paulo Henriques Britto expõe sua visão de tradução e explica, com exemplos práticos, todos os elementos que devem ser levados em conta na tradução poética.
Por: Paulo Henriques Britto
Publicado em 24/03/2012 | Atualizado em 24/03/2012

A tradução é uma forma de reescrita; traduzir é reescrever um texto numa língua diferente. O objetivo é produzir um texto que possa substituir o original, para aqueles que desconhecem o idioma em que ele foi escrito. O tradutor é, pois, um tipo específico de autor.
O ofício do tradutor é semelhante ao do ator: ele exige do público a “suspensão voluntária da descrença”
Visto, porém, de outro ângulo, seu ofício é semelhante ao do ator: ele exige de seu público o que o poeta e crítico romântico inglês Samuel Taylor Coleridge chamava de “suspensão voluntária da descrença”. 
Quando vou ao teatro – um teatro convencional –, sei que o ator que vejo à minha frente é um ator; voluntariamente, porém, ponho de lado esse conhecimento e, num outro nível da minha consciência, encaro-o como se ele fosse Hamlet, o príncipe da tragédia de William Shakespeare, suspendendo minha atitude de descrença em relação à existência real de Hamlet e à identificação entre ator e personagem. 
Do mesmo modo, quando leio uma tradução de Liev Tolstói ponho entre parênteses, por assim dizer, meu conhecimento do fato de que estou lendo um texto em português produzido por um tradutor brasileiro, e faço de conta que o livro que tenho nas mãos foi escrito por um autor russo em seu próprio idioma.  


Contar a história e imitar o estilo

O trabalho do tradutor exige que ele não apenas conte a mesma história contada por Tolstói, mas também que imite as peculiaridades de Tolstói como escritor, aquilo que encaramos como suas marcas de estilo: seu jeito de apresentar os personagens, de comentar toda a ação de um plano superior que lhe confere uma autoridade quase divina, sua maneira de utilizar a sintaxe etc.
O produto final da tarefa do tradutor tem que ser um romance em português, e mais: um romance em português que pareça, de algum modo, ter sido escrito por Tolstói.
Todas as exigências feitas à tradução de um texto em prosa ficcional se impõem ao tradutor de poesia
Todas as exigências feitas à tradução de um texto em prosa ficcional se impõem ao tradutor de poesia. Quando me proponho a traduzir um poema de Emily Dickinson, meu objetivo é produzir um texto que seja um poema em língua portuguesa e que também seja, de algum modo, um poema de Dickinson. 
É preciso ‘dizer a mesma coisa’ que Dickinson diz, e também dizê-lo do modo como ela o diz no inglês, um idioma muito diferente do português. Mas no caso da poesia, a exigência de escrever à maneira do autor original tem implicações drásticas. Na prosa de ficção ocidental parece possível, ao menos à primeira vista, estabelecer prioridades: há uma história a ser contada, que envolve determinados personagens num meio físico e social determinado; recriar isso seria o objetivo fundamental do trabalho do tradutor.

Acesse a reportagem completa em : http://cienciahoje.uol.com.br/revista-ch/2012/290/a-arte-de-traduzir-poesia
 

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

A memória é a lição

Professora de português aposentada faz livro que narra toda a sua trajetória profissional. A obra confunde-se com a história do ensino no Brasil nos últimos 30 anos.
Por: Thiago Camelo


Em determinada passagem do recém-lançado livro Aprendiz de professora: o aluno desarrumado e outras histórias, Ynah de Souza explica aos mais novos para que serve o giz e o que é quadro-negro.
Souza, professora de português aposentada, com quase 20 anos de aulas no Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco no currículo, explica:
“É claro que tem um pouco de ironia, de provocar as pessoas que acham que aula agora é só com computador e alta tecnologia. Mas o comentário também serve para tornar o livro mais atemporal, já que alguém pode lê-lo daqui a dez anos, quando é factível que um jovem de fato não saiba mais o que é um giz.” 
Essa preocupação com a memória é, no fundo, o cerne do livro escrito por Souza. São 146 páginas que contam a trajetória de uma professora no Brasil. Claro que é apenas uma trajetória, entre tantas possíveis, num país com um sistema educacional bastante heterogêneo.
Mesmo assim, ler o relato do percurso de Souza – de professora ‘caloura’ num colégio no interior do Rio de Janeiro a titular de uma das escolas públicas mais respeitadas do país – ajuda a compreender as mudanças por que passou a educação nacional nas últimas três décadas.
Os vários artigos do livro foram escritos no decorrer de todos esses anos e publicados em revistas e páginas de internet voltadas para a educação. A professora incluiu, no entanto, comentários atuais nos textos. Assim, foi possível estabelecer um diálogo entre expectativas do passado e realidade do presente.
E é curioso como esse tipo de diálogo entre passado e presente se dá. Por exemplo: Souza acompanhou o começo da entrada dos computadores nas escolas, ainda na década de 1990. Escreveu, inclusive, texto em que pedia atenção para “o novo milênio”, que chegava “inaugurando uma época de mudanças e inovações”.

Diálogo e exemplo

Olhar retrospectivamente esses textos faz com que, inevitavelmente, o leitor entre numa competição de ‘certo ou errado’ com a opinião da professora. Esse jogo não incomoda Souza, que afirma sempre privilegiar o diálogo e a troca de experiência – mesmo que haja discordância.
“Os novos professores precisam de uma referência, de alguém que goste de fato do que faz”, diz a educadora, que, depois da aposentadoria, passou a orientar novos professores de português. “Já recebi abraço em evento sob a justificativa de que era a primeira professora feliz que a pessoa tinha visto. Isso faz pensar na nossa profissão”, completa.
Os relatos de Souza não se detêm apenas em questões abrangentes como tecnologia em sala de aula. Alguns casos são relatos de situações bem específicas, como o que empresta nome ao título do livro.
O tal “aluno desarrumado” era uma estudante que não conseguia organizar o material de sala de aula ou guardar as regras da gramática. Esse fato fez com que os seus pais cobrassem da professora a aplicação de apenas um livro que reunisse todos os textos e exercícios – uma gramática grossa e convencional, que ensinasse na base da decoreba.
Souza aproveita o mote dessa discussão específica para desenvolver sua visão do ensino de português, no qual as regras podem ser aprendidas a partir do uso oral e escrito da língua.
“Tenho muito interesse na área de livros didáticos”, conta a professora. “Existe um monopólio editorial no eixo Minas Gerais, São Paulo e Paraná; morar no Recife faz com que eu tenha vontade de fazer obras ligadas à realidade daqui”, diz Souza, com o sotaque nada pernambucano que entrega sua origem carioca.

fonte: Ciência Hoje (http://cienciahoje.uol.com.br/alo-professor/intervalo/2012/01/a-memoria-e-a-licao/view)