Estou indo embora. Não há mais lugar para mim. Eu sou
o trema. Você pode nunca ter reparado em mim, mas eu
estava sempre ali, na Anhangüera, nos aqüíferos,
nas lingüiças e seus trocadilhos por mais de
quatrocentos e cinqüenta anos.
Mas os tempos mudaram. Inventaram uma tal de reforma
ortográfica e eu simplesmente tô fora. Fui expulso
pra sempre do dicionário. Seus ingratos! Isso é uma
delinqüência de lingüistas grandiloqüentes!
O resto dos pontos e o alfabeto não me deram o menor
apoio... A letra U se disse aliviada porque vou
finalmente sair de cima dela. Os dois pontos disse
que eu sou um preguiçoso que trabalha deitado enquanto
ele fica em pé.
Até o cedilha foi a favor da minha expulsão, aquele
C que fica se passando por S e nunca tem coragem de
iniciar uma palavra. E também tem aquele obeso do O
e o anoréxico do I.
Desesperado, tentei chamar o ponto final pra
trabalharmos juntos, fazendo um bico de reticências,
mas ele negou, sempre encerrando logo todas as discussões.
Será que se deixar um topete moicano posso me passar por
aspas? A verdade é que estou fora de moda. Quem está na
moda são os estrangeiros, é o K, o W "Kkk" pra cá,
"www" pra lá.
Até o jogo da velha, que ninguém nunca ligou, virou
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